
André Castro
Você pode não ter percebido, mas a igualdade de gênero ainda não chegou às estantes. Na última edição do maior evento de literatura do país, a Festa Literária Internacional de Paraty, apenas 25,6% dos escritores convidados eram mulheres. Dos quarenta membros da Academia Brasileira de Letras, apenas cinco são mulheres. Esse demérito à produção literária feminina acontece não só no Brasil. O Nobel de Literatura, o mais importante prêmio desta arte, já distribuiu ao longo de sua existência 112 prêmios, sendo que apenas 14 mulheres foram laureadas.
Engana-se quem pensa que essa desigualdade acontece porque as mulheres não escrevem tão bem quanto os homens. Na maioria das vezes, o mercado editorial não aceita mulheres escritoras da mesma forma que aceita os homens, pelo simples fato de serem mulheres. Uma prova disso é o relato dado pela escritora norte-americana Catherine Nichols ao site Jezebel, sobre uma experiência vivida por ela em 2015. Após enviar o manuscrito de seu novo livro para cinquenta agentes literários e receber apenas duas respostas positivas, Nichols enviou o mesmo manuscrito sob pseudônimo masculino e dessa vez recebeu dezessete respostas positivas em cinquenta tentativas. Nesse teste, as respostas vieram muito mais rápidas, e mesmo as rejeições vieram com elogios à obra, ao invés das críticas recebidas quando enviou o manuscrito assinado com o seu próprio nome.
Inspirada por essa disparidade, a escritora inglesa Joanna Walsh criou em 2014 a campanha #ReadWomen2014 (Leia Mulheres 2014), visando incentivar a leitura de obras escritas por mulheres. O sucesso da campanha repercutiu no mundo inteiro e no Brasil o projeto Leia Mulheres surgiu em 2015, na forma de um clube de leitura em São Paulo. Hoje, o grupo promove encontros em mais de vinte cidades de diferentes estados. Em Belo Horizonte, os encontros acontecem mensalmente e os livros são escolhidos por enquete e divulgados com antecedência. Qualquer pessoa que tenha interesse em ler e discutir livros escritos por mulheres pode participar do grupo. Cada encontro reúne, em média, trinta pessoas.
“Nós sempre escolhemos um tema diferente e abrimos para sugestões e votações. Já tivemos literatura do século XXI, suspense, terror, história em quadrinhos…” conta Mariana Castro, estudante do Departamento de Ciência Política da UFMG e uma das mediadoras do grupo Leia Mulheres em Belo Horizonte. Ela explica que “por muito tempo a literatura escrita por mulheres foi categorizada como ‘literatura feminina’, não importando de qual gênero literário o livro se tratasse” e ressalta que a escrita das mulheres tem uma diversidade enorme. “Elas escrevem todos os gêneros, sobre vários assuntos. Acredito que as mulheres têm diversificado mais nesse sentido. Os personagens criados pelos homens são, geralmente, homens de classe média, enquanto os das mulheres variam muito mais. Elas dão mais voz a outros personagens”, afirma.
Olívia Gutierrez, aluna do curso de Biblioteconomia da UFMG, também é mediadora do grupo em BH. Ela explica que o clube de leitura visa mostrar a diversidade de gêneros e contextos trazidos pelas mulheres e incentivar a leitura para além do ambiente acadêmico. Busca exercer, também, uma ação política junto ao mercado editorial. “Existem poucas mulheres sendo publicadas e, consequentemente, poucas mulheres sendo lidas. Então, temos uma ação política e um pouco mais pragmática, uma mensagem para os editores de que estamos lendo mulheres e de que é necessário publicar mais obras de mulheres para que elas tenham mais visibilidade”, enfatiza Olívia.
Voltamos à reflexão: no último ano, quantas escritoras você leu? Independentemente da resposta, vale a pena se engajar no projeto Leia Mulheres! Saiba mais acessando a página www.leiamulheres.com.br e o grupo do facebook Leia Mulheres – Belo Horizonte.
(Dalila Coelho)

