
Sentir culpa por dormir 8h não é normal. Deixar de comer por falta de tempo não é normal. Ter crises de depressão por estar sobrecarregado não é normal. Com cartazes que exibiam frases como essa, a campanha #Nãoénormal, dos estudantes da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, viralizou na Internet e foi aderida por universitários de todo o país. As denúncias deixaram o espaço físico para conquistar mais de 25 mil curtidas na página do Facebook “FAU não é normal”, criada em maio deste ano.
“Primeiro decidi trancar algumas matérias, mas eu não conseguia levantar da cama (literalmente) nem para fazer as que restaram”. “Devido ao acúmulo de trabalhos, que exigem muito tempo de dedicação fora do período de aula, passei a ter cólicas abdominais agonizantes várias vezes por semana”. “Por causa de uma disciplina o nível de estresse foi tão alto que precisei de ajuda médica”. (Relatos dos alunos da FAU, segundo o Jornal do Campus da USP)
Como ficou claro pelo número surpreendente de curtidas e compartilhamentos, além de iniciativas do mesmo modelo em universidades do Piauí, Paraná e Alagoas, por exemplo, essas experiências se tornaram “comuns” na vida acadêmica. Metade dos universitários brasileiros vivenciou algum tipo de crise emocional no ano passado, segundo a Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes).
“Realmente, a gente não consegue levar tudo nos ombros. Não tem como, por mais que a gente queira brincar de Atlas, a gente não vai conseguir fazer isso nunca”, diz Natália Cordeiro, estudante de Letras da UFMG. A aluna cursava Física e conta que, por trabalhar fora da universidade, ela vinha para o campus à noite e não sobrava tempo, então estudava e fazia trabalhos de madrugada.
Em época de provas, sua rotina se tornava ainda mais estressante e sobrecarregada. No meio disso tudo, foi na literatura que encontrou um escape – além de uma nova direção. Natália começou a se interessar por poesia clássica e, lendo os versos de Homero, a estudante percebeu que estava no curso errado. “Piquei o pé, fiz o ENEM de novo e mudei pra cá”.
Um de seus antigos colegas da Física, Marcos Moreira, conta que ainda no semestre passado, estava fazendo uma média de 15 horas dedicada à faculdade, com aulas e estágio, sem contar o tempo de translado. O curso já lhe trouxe insônia, ansiedade e o fez colocar o resto da vida em segundo plano. Ler era seu maior hobby e mesmo este hábito foi prejudicado. Foi aí que aprendeu a ler no ônibus.
“Recomendo muito a pessoa ler coisas mais simples pra poder arejar a cabeça, motivar e distrair um pouco. Acho que é muito bom porque te mostra outras situações. Às vezes, você fica tão bitolado com a universidade que aquilo ali vira o mundo. Mas quando você lê outros livros, vê outras situações, acaba expandindo sua mente”.
J. R. R. Tolkien, Stephen King, Fernando Sabino ou Machado de Assis. Para Marcos, a literatura é uma “fonte de energia” quando a dele já está esgotada. “É uma forma de descansar a mente, ajudar a focar em outras coisas. Por questão de tempo, é muito complicado conciliar o que você realmente quer ler com o que você realmente tem que estudar ou aprender,” diz Natália. Para os dois, a solução foi desacelerar.
“Parar um pouco, nem que seja um dia ou algumas horas da semana para fazer alguma coisa que você gosta – seja fazer música ou desenhar, ler, escrever – ajuda muito a manter a cabeça no lugar e continuar saudável aqui dentro”, reflete Marcos.
O que é normal
Saúde mental é coisa séria. Para obter atendimento psicológico na UFMG, o Plantão Psicológico atende de 8h às 19h na sala 2062 da Fafich, no campus Pampulha.
Mais informações em (31) 3409-5070.
(Lívia Araújo)

